segunda-feira, 23 de abril de 2012

Agenor


− Agenor, cuida das crianças um instantinho enquanto eu tomo sol, Bem ?
− Ah...vai começar o campeonato de biribol, Nega.
− Puxa, Agenor. O que custa? Um minutinho. Você nunca fica com as crianças. Eles sentem a sua falta, sabia? Outro dia mesmo peguei o Agenorzinho olhando uma foto sua e chorando.
 −Ai, Nega, não dramatiza. Que exagero!
− Exagero? O pior nem foi ele chorar de saudade de você. A pior parte foi a Alzira olhar a cena e perguntar quem era aquele da foto.
− Você faz tempestade num copo d’água. Meu amigo Moacir fica fora seis meses no ano e a mulher dele não abre a boca.
− Claro, né, Agenor. Ela ocupa bem o tempo com o motorista enquanto as crianças ficam o dia todo na escola. Ela não abre a boca para o Moacir, mas para o motorista...
− Deus que me livre, Nega. Que língua que você tem.
− Eu? Língua tem o motorista do Moacir. Isso é o que a mulher dele diz.
− Aff! Quero morrer seu amigo.
− Amigo, não, Agenor. Marido. Ma-ri-do. Pai das crianças. E por falar nisso, vai dar uma olhada neles, que daqui a pouco o sol vai embora e eu fico sem marquinha.
− Você não quer marquinha, Nega. Você quer é um câncer de pele, isso sim. Ta que parece um carvão
− Mas você é despeitado, não, Agenor? Pior é você, que volta da praia, branco feito um fantasma.
− Pelo menos vou viver 200 anos. Vou longe, minha filha.
− Com essa barriga, Agenor?
−O que tem, minha barriga?
− Faça-me o favor. Essa sua barriga é uma ópera ao AVC. É um atestado de entupimento de artéria. E nem vai dar para ver sua pele tão intacta quando você ficar roxo no meio do seu ataque cardíaco.
− Vira essa boca prá lá. Olha, você é bem igual a sua mãe!
−O  que tem, minha mãe?
− Que que tem? Ela matou seu pai de tanto falar que o estômago dele era fraco e ele iria explodir. Dito e feito. O homem explodiu, mesmo.
− O meu pai não explodiu, Agenor!
− Todo mundo diz que ele explodiu. No meio do churrasco da firma. O estômago não aguentou a pressão da angústia de ser casado com sua mãe, minha filha. Bum. Morreu lá mesmo. E dizem que sua mãe ainda ficou gritando no ouvido dele: Eu disse. Eu disse!
− Cala a boca, Agenor. Você nem sabe de nada.
− Ah, não? Sei sim, minha filha. Você e sua mãe são como mensageiras do apocalipse. E depois vem falar mal da mulher do Moacir. Pelo menos, ela dá pro motorista e deixa o Moacir em paz. Eu e seu pai não tivemos a mesma sorte.
− Ah, é? Ah, é, Agenor. Então, tá.

− Crianças! Vamos embora! Agenorzinho, Alzira, Rogério, Odetinha. Vamos! Chamem os gêmeos que nós vamos embora.
− Ah, mãe! Vamos ficar mais! A gente nem participou da brincadeira dos monitores.
− Vamos embora e pronto.
− E o papai?
 − O papai vai ficar jogando biribol.

Não teve mais nem menos. As mães, quando decidem, vão embora. As crianças seguiram em fila.
Agenor deu de ombros. Melhor. Agora sim iria curtir os amigos, beber sua cerveja, comer os pastéis de camarão.

− Abram espaço aí, gente. Vou dar uma bomba na piscina. Vamos jogar biribooooool!
− Vem, Agenor, gritaram os amigos.
Agenor deu um impulso. Correu com as perninhas curtas e gordas. Os amigos abriram espaço.
Lá foi Agenor pelos ares, mas, antes mesmo de cair na piscina, sentiu uma dor no peito e a pele branca arroxeou.

As crianças ainda ouviram o grito do pai, ao longe, e não entenderam quando a mãe murmurou: Eu disse!

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