Toda mulher sonhava em casar-se com um médico. Talvez, toda,
seja um exagero, mas muitas sonhavam em constituir uma tradicional família ao
lado de um bem sucedido homem da área da saúde. Um quase herói, salvador da
espécie humana, operário em prol da qualidade de vida e longevidade do seu
semelhante. Isso, é claro, era no tempo que o médico dedicava-se a essas
banalidades.
Hoje em dia, muitas fêmeas ficariam com seus coraçõezinhos
pulsantes e românticos batendo velozmente, caso conseguissem fisgar um bom jogador
de futebol. Nada como ter um marido que ganha em euro.
Mas, o caso que conto aqui, é diferente. É um caso típico de
mãe.
Uma boa mãe, mãe zelosa, protetora e perspicaz, quer mesmo é casar-se
com um pediatra. Que maravilha durante uma otite, catapora, bronquite,
pneumonia ( nos casos mais graves) ou, até, uma simples frieira, poder olhar
para seu lado na cama e dar de cara com um pediatra. A mãe, com as bochechinhas
rosadas e o sorriso alegre, em questão de minutos resolveria o problema, sem
precisar ligar para ninguém, enfrentar uma fila no pronto socorro, sem imaginar
loucuras com sua cabeça fértil e apavorada. Bastaria um pedido, um olhar, no
máximo, uma piscadela, e seu protetor, seu herói da penicilina, do
estetoscópio, levantaria seus braços fortes e colocaria em uso seu cérebro
privilegiado, para aquela casa voltar ao seu sossego habitual e aquela mãe
respirar com um alívio que só as mães conhecem. É aquele que se sente ao olhar
um filho saudável a correr pela sala, enquanto a empregada faz saltos mortais
na tentativa de salvar um cristal.
Quando Suely comunicou à família que estava deixando seu
amado Pedro, pai de seus três filhos para casar-se com o Dr. Alfredo, foi um
choque. Maior para os homens da família, para os maridos das amigas e para as
solteiras ou casadas sem filhos. As mães fizeram uma cara que seus maridos
julgaram ser espanto, mas que, na realidade, era inveja pura. Era uma sensação
de incompetência. “Por que não pensei nisso antes”
Pedro tentou de tudo. Argumentou, chorou, ameaçou, mas Suely
disse que era preciso. “Sim, eu te amo, Pedro, mas a questão aqui é o bem estar
das crianças”.
O homem questionou sua capacidade como pai. Será que fez
algo errado? Não. Tinha conversado com a barriga da mulher enquanto ela gestava
aqueles bebês, mesmo achando que de nada serviria. Leu os livros especializados,
assistiu aos partos, segurara as mãos firmes da mulher parindo. Até hoje não
sentia o mindinho. Tinha ido a todas as reuniões de escola, consultas médicas,
aniversários em buffets que eram a própria ilustração do inferno. Todos estavam
em boas escolas, faziam inglês, natação, dança, piano. Frequentavam a fono,
dentista, psicólogo. Fora as viagens, os passeios de final de semana.
Passaram-se três meses. Pedro, tomado de uma gota de coragem,
foi até o apartamento da esposa com o propósito de fazê-la desistir daquela
loucura. Tocou a campainha e, para sua surpresa, quem atendeu foi o próprio Dr.
Alfredo. Trocaram um mínimo sorriso. Um leve balançar de cabeças.
Ele entrou, já não tão corajosamente. Podia estar enganado
mas teve a impressão de que o Dr. Alfredo tentara derrubá-lo usando sua
bengala. Aquele velho cretino.
Suely veio sorrindo abertamente e ficou surpresa ao ver o ex
marido parado no meio da sala. Ele pediu um minuto de sua atenção e foram ao
escritório para ter a conversa final, como ela mesma disse.
O pobre marido, ex marido, mais uma vez humilhou-se, fez
pedidos, promessas e, por fim, usou um argumento que jurou que não iria usar,
por ser mais um constrangimento que era imposto sobre ele mesmo:
− Suely, pelo amor de Deus, o homem tem oitenta anos!!!!
− Que baixo que você é, Pedro. Fique sabendo, que o Julio
tem cinco anos. ( Julio era o caçula)
− E o que tem isso a ver, Suely?
− Tem que se o meu atual marido, meu marido pediatra ( disse
isso com orgulho e certa prepotência) fizer a gentileza de viver mais 10 anos,
já terá sido de grande valia. E me dê licença!
Virando as costas foi até a cozinha porque era hora de
preparar a gemada do Dr. Alfredo.
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